quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Seu Eduardo




Fazia tempo que eu não ia a Araçatuba. Saí de lá com 12 anos e viajar da nova casa no Paraná de volta à terra natal nem sempre era possível. Como ia com a família, as visitas aos tios, avós e compadres tomavam quase todo o tempo. Mas eu tinha  as minhas lembranças. O colégio, a rua, os amigos, as praças, a padaria do seu Manoel. Conforme o tempo passava e a memória deixava de  lado muitas  referências, a impressão que dava era de que eu poderia perder tudo em algum arquivo deletado dentro de mim.
Hoje sinto que ainda me devo isso. Numa das poucas vezes que consegui voltar, a experiência foi curiosamente estranha. Passei pela Escola Luiz Gama, onde estudei até a sexta série.Lá que estavam depositadas muitas das minhas experiências. Foi onde a professora Umbelina elogiou meus primeiros textos. Como era raro falarem sobre algum talento meu,  nunca  esqueci disso. O problema é que ao mesmo tempo em que sabia fazer uma redação tinha uma letra horrorosa. Um computador naquela época hein? Ou umas boas aulas de caligrafia...
Lá também conheci a professora Antônia, de Estudos Sociais. Quando ela teve um filho, fiz minha primeira visita de cortesia sozinho. Nem sei onde consegui coragem. Fui, levei lembrancinha e tomei café enquanto apreciava aquela pessoinha que tinha chegado e tiraria minha professora da sala de aula pelos próximos meses.
A visita ao colégio também teve uma pitada de dor. Procurei "seu Eduardo", o funcionário que era uma espécie de faz-tudo e  nosso grande amigão. Sorriso gratuito, dentes brancos, combinando com sua pele negra e bonita, e que ganhava força com uma voz grave, vibrante, sem nunca perder a calma. Na sala da diretora  recebi a notícia de que ele havia morrido. Triste, olhei de novo para o prédio... tudo pareceu menor. As salas, a quadra de esportes, a cantina, os banheiros. Também me senti menor! Devia ter ido antes. Me encontrado com ele pra dizer que muito do que aprendi não foi dentro da sala de aula. Mas no pátio, onde o lixo ia pro lixo, com coleguinha não se briga e compartilhar o lanche era uma ação digna de respeito. Seu Eduardo foi uma espécie de confirmação daquilo que meu pai ensinava sobre gentileza e educação. Devem estar juntos os dois hoje, observando se aprendi a fazer a lição de casa.