quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Lilico foi um dos meus  heróis da infância. Não o personagem de  TV. De quem meus pais eram fãs. Mas o cachorro lá de casa. Cujo nome foi dado por causa do Lilico da telinha; engraçadíssimo com seu bordão no programa Balança  Mas Não Cai: “Alô Brasil...aquele abraço”, e mais tarde na Praça da Alegria, com o homem do bumbo cantando “ Tempo bom, não volta mais... saudade de outros tempos, de paz”.


Pois então, ele é quem inspirou o batismo do vira-lata mais inteligente e fascinante que tivemos. Protagonista de um dos episódios marcantes na vida da família. Pelo menos é assim que ainda enxergo.  Cada um vê  com a dimensão que a emoção permite e os olhos da alma alcançam.

Eu estava jogando bola no campinho ao lado de casa, coisa que  fazia até mesmo quando chovia, e de repente começou o alvoroço que havia quando a carrocinha aparecia no bairro. Os homens que recolhiam os cachorros na rua, eram os vilões que toda criança odiava. Ainda mais com as histórias de que os cãezinhos pegos sem coleira iam direto para a fábrica de sabão.
Curioso como os vira-latas  eram resistentes e cumpriam muito bem o seu papel de membro da família sem pedigree. E nosso Lilico era o cara. Interessante também como a liberdade deles era incrivelmente recompensada com sua fidelidade. Sem coleira. Era assim que  viviam. Não que elas fossem caras. Mas o vira-latas  que entrava pela cozinha como membro da casa era um ser livre. Mesmo tendo suas obrigações familiares. Por isso, para mim, a carrocinha era o carro do inferno.

Naquela manhã, quando a gritaria da meninada aumentou, meu precioso Lilico foi capturado. Levaram o xodó dos Domingues e meu grande amigo. Entrei em casa, chorei atrás da porta do quarto, como poucas vezes. Até que minha mãe gritou alto, num rompante de alegria que nem era comum em seu comportamento mais na dela mesmo. Lilico havia voltado. Correu para debaixo da cama, onde também corri para encher meu pequeno herói de beijos. As lambidas eram os beijos dele.

Poucos minutos depois um homem bateu em casa para falar com dona Paulina. Disse que era da carrocinha e que um dos cachorros havia conseguido levantar a tramela da porta do furgão fazendo com que todos os cães escapassem. A rua ficou cheia e os vilões teriam que recomeçar tudo de novo.
Como quem não tinha nada com isso, mas desconfiada de que o autor da façanha era o nosso Lilico, ela despistou, disse que estava preparando o almoço e voltou para dentro. Me contou o caso e rimos para a vida toda. Se de fato foi ele quem causou a lambança eu não sei dizer. Mas para mim foi! Meu herói e o maior de todos para a cachorrada do bairro. Tempo bom.