quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Esparadrapos e mertiolate



Não me  lembro  bem quantas vezes já me machuquei. Não estou falando de sentimentos: paixão, decepções e dores do coração, nada disso. Estou falando de machucado pelo corpo. Cabeça, tronco e membros. Partes quebradas, edemas, torções, cortes e traumas em geral. Sei que comecei cedo. São várias as lembranças de minha mãe, pai, tias ou vizinhos fazendo algum tipo de socorro. 

Uma vez foi um escorregador improvisado numa pilha de tijolos. A rampa não aguentou a farra, quebrou, levou consigo uma parte dos tijolos e outra do meu nariz. Fragmentos do excesso de brincadeira foram encontrados e retirados das narinas durante algum tempo.
Depois, ao sair correndo para a cozinha, rumo a um intervalo mais saboroso, o escorregão levou a uma pancada na quina de um objeto que certamente não precisava estar ali. O corte profundo e os pontos na cabeça foram a porta de abertura para uma série de outras contusões; dentro e fora.

Se engana quem pensa que foi meu eu criança quem mais me levou ao hospital. O adolescente e o adulto também visitaram o pronto-socorro, a enfermaria, a sala de exames, a tomografia, a consulta, diversas vezes.
Uma perna quebrada após ser atropelado por um carro de Fórmula 3, quando cobria uma prova para a TV, uma amnésia após uma queda jogando futebol, seguida de um edema, que só não me tirou a vida porque o médico teve o cuidado de ter uns cuidados a mais. 

Sem contar tornozelo, braço e joelho vítimas do futebol. E ainda os acidentes de carro. Nada muito sério, mas suficientes para entrar na lista. Se somar as vezes em que me afoguei, ou a escapada à la 007 no dia em que uma revolução foi deflagrada no Paraguai e eu estava lá fazendo uma reportagem sobre as compras na fronteira, nada mais. De repente me vi cercado de soldados e um comandante nos ameaçando com prisão caso não atravessássemos a Ponte da Amizade em um minuto. Nem preciso dizer que batemos o recorde da travessia binacional.

Interessante eu me lembrar de tanta coisa e ainda ousar escrever, compartilhar. Acho que estou fazendo isso para documentar algo, agradecer pela vida e ao mesmo tempo desabafar. Afinal, é raro a gente conseguir contar essas coisas para alguém até o fim. Geralmente quem nos escuta tem uma história com mais drama, mais sangue, maior tempo de internação. Uma UTI, uns pinos a mais, ou remédios pela hora da morte podem  arrasar o entusiasmo de qualquer um. E foram poucas as vezes que falei sobre essas dores e dissabores. Quando tentei, meu interlocutor tinha um episódio maior, mais profundo. Por essas e por outras não estou autorizado a me queixar. No máximo a começar a conversa e esperar que alguém me interrompa e diga, como fazia o Braguinha de outra crônica: “isso não é nada!!!”